Licença-Prêmio e Aposentadoria: Tenho Direito à Indenização em Dinheiro?

A licença-prêmio é um benefício consagrado no regime jurídico de servidores públicos, e sua não fruição durante o tempo de serviço pode gerar direito à conversão em pecúnia, ou seja, ao recebimento do valor correspondente em dinheiro. Muitos servidores se aposentam sem terem usufruído desse direito — e, muitas vezes, sequer são informados de que é possível buscar judicialmente essa indenização.

GC

Gabriele Bertoncello de Couto

18 de agosto de 2025

1. O que é a licença-prêmio?

A licença-prêmio é um direito estatutário concedido aos servidores públicos que completam determinado período de exercício sem faltas injustificadas ou punições disciplinares. Trata-se de uma licença remunerada que, via de regra, é concedida a cada cinco anos de serviço efetivo, com duração de três meses.

Durante esse período, o servidor é afastado de suas funções, sem prejuízo da remuneração. No entanto, nem sempre o servidor consegue usufruir do benefício enquanto está na ativa, seja por conveniência da administração, seja por acúmulo de demandas no serviço público. Nesses casos, a questão que se coloca é: o que acontece com esse direito após a aposentadoria?

2. Me aposentei e não usufruí das licenças-prêmio. E agora?

Se você é servidor público aposentado e não usufruiu integral ou parcialmente das licenças-prêmio adquiridas durante sua vida funcional, há forte possibilidade de pleitear judicialmente a conversão desse tempo em indenização pecuniária.

A jurisprudência dominante, tanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ) quanto nos Tribunais Estaduais e Regionais, tem reconhecido que a não fruição da licença-prêmio por motivo não imputável ao servidor gera o dever de indenizar por parte da Administração, sob pena de enriquecimento sem causa.

A Tese 635 do Supremo Tribunal Federal (STF) é expressa nesse sentido:

É assegurado ao servidor público inativo a conversão de férias não gozadas, ou de outros direitos de natureza remuneratória, em indenização pecuniária, dada a responsabilidade objetiva da Administração Pública em virtude da vedação do enriquecimento sem causa.

A partir disso, o Tema repetitivo 1086 do STJ, julgado em 30/03/2021, também alinhou-se ao entendimento de direito do servidor inativo à conversão em pecúnia da Licença Prêmio não usufruída:

TEMA 1086 STJ – Presente a redação original do art. 87, § 2º, da Lei n. 8.112/1990, bem como a dicção do art. 7º da Lei n. 9.527/1997, o servidor federal inativo, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração e independentemente de prévio requerimento administrativo, faz jus à conversão em pecúnia de licença-prêmio por ele não fruída durante sua atividade funcional, nem contada em dobro para a aposentadoria, revelando-se prescindível, a tal desiderato, a comprovação de que a licença-prêmio não foi gozada por necessidade do serviço.

Ou seja, se o servidor não gozou a licença nem a utilizou para fins de aposentadoria, nasce o direito à indenização.

3. É necessário ter feito um pedido na via administrativa?

Não. O entendimento pacífico dos tribunais é de que o simples fato de o servidor ter se aposentado sem usufruir das licenças-prêmio já configura ato omissivo da Administração, que autoriza o ajuizamento direto da ação judicial, dispensando-se o prévio requerimento administrativo.

4. Existe prazo para ajuizar a ação?

Sim. O direito à indenização prescreve em cinco anos contados da data da aposentadoria. Portanto, é fundamental que o servidor inativo esteja atento a esse prazo para não ter seu direito fulminado pela prescrição.

5. Como é feito o cálculo do valor da indenização?

A indenização tem como base a remuneração do servidor à época da aposentadoria, considerando todas as verbas de caráter permanente que integravam sua folha de pagamento.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que:

As rubricas que compõem a remuneração do servidor deverão ser incluídas na base de cálculo da conversão da licença-prêmio em pecúnia, pois é cediço que as verbas mencionadas pelo Recorrente, abono permanência, décimo terceiro salário e adicional de férias, integram a remuneração do cargo efetivo e possuem natureza permanente, devidas ao servidor quando em atividade, integrando, portanto, a base de cálculo para a conversão da licença-prêmio em pecúnia.

Isso significa que valores como abono permanência, gratificação natalina (13º salário) e adicional de férias devem ser incluídos no cálculo da indenização.

6. Preciso comprovar que pedi para gozar a licença e não deixaram?

Não. De acordo com a jurisprudência consolidada, não é exigido que o servidor comprove ter solicitado o gozo da licença e que ela tenha sido negada. Basta demonstrar que o benefício foi adquirido durante a atividade e que não foi gozado nem utilizado para contagem de tempo na aposentadoria.

7. Conclusão: vale a pena buscar esse direito?

Sim. Muitos servidores desconhecem esse direito e deixam de receber valores consideráveis que lhes são devidos.

Se você se aposentou há menos de cinco anos e não usufruiu das licenças-prêmio adquiridas, é recomendável procurar um advogado especializado para analisar sua documentação e viabilidade do pedido. Em geral, é possível obter a indenização judicialmente, com correção monetária e juros legais, inclusive nos casos de servidores vinculados a entes municipais ou estaduais.